É este o início de outro crash financeiro?
A História se repete depois de quatro anos, quando os mercados globais entram em derretimento. Texto de Julian Knight
Sunday, 7 August 2011
do jornal britânico Independent
Talvez tenha algo a ver com agosto, quando muitos dos líderes do mundo estão em férias, mas o mês está se tornando notório pela confusão no mercado financeiro. Quatro anos atrás as mandíbulas que esmagaram o crédito se fecharam. O início foi marcado pela decisão do BNP Paribas [baseado na França, um dos maiores bancos do mundo] de fechar dois de seus fundos expostos à crise do sub-prime nos Estados Unidos, no dia 9 de agosto de 2007. Dentro de algumas semanas, as filas começaram a se formar nas portas das agencias do Northern Rock [banco britânico estatizado por causa da crise].
Quatro anos e muitos resgates depois, a economia do mundo parece de novo à beira do precipício, com os mercados de ações de todo o mundo perdendo bilhões de dólares em um dos mais sangrentos derretimentos desde o crash de 2008. O preço das ações despencou no Brasil, em Tóquio, Nova York, Londres, México e em toda a Europa.
Mais de 10% sumiram do índice FTSE 100 de Londres — equivalente a 270 bilhões de libras [cerca de 700 bilhões de reais] — em uma semana e 114 bilhões de libras foram perdidos* [cerca de 300 bilhões de reais] apenas na sexta-feira. O índice perdeu 600 pontos na semana, fechando em 5.240, no mesmo nível do início do ano. Em Nova York o índice Dow Jones despencou 5,3% em uma semana.
Angus Campbell, chefe de vendas da Capital Spreads, disse na sexta-feira: “No começo do ano, os investidores estavam esperando crescimento global… Mas agora há um repensar maciço já que parece que o crescimento global vai estancar. Isso causou a tremenda quantidade de vendas — é realmente a mentalidade do rebanho”.
Desta vez, os empréstimos sub-prime [empréstimos para comprar casas, de alto risco, nos Estados Unidos] não estão na raiz do problema, mas uma coisa potencialmente muito pior. Muitos governos ocidentais, tendo socorrido os bancos seguindo o modelo keynesiano de imprimir moeda para enfrentar a recessão, estão de tal forma carregados de dívidas que os mercados perderam a fé de que eles conseguirão pagar os juros, o que dizer do principal. A aparentemente inesgotável linha de crédito dos governos, que mantém funcionando o sistema financeiro e o fundo de pensão de quem lê, é o que está sendo esmagado desta vez.
Na semana passada, o governo da Espanha viu o seu custo de fazer empréstimos crescer 0,5% em pouco tempo — agora é 4% mais caro para o governo espanhol fazer empréstimos que a taxa de juros paga pelo governo da Alemanha. Mas os espanhóis não parecem estar tão mal quando a Itália. A confusão do mercado anda de mãos dadas com a confusão política do fraco governo de Silvio Berlusconi, que está fazendo muito pouco para desfazer a impressão de que, com dívida igual a 128% de seu PIB, a oitava maior economia do mundo pode pagar as contas. De novo, os juros que os italianos pagam estão se aproximando do pago pelos espanhóis, em direção às taxas da Grécia.
O problema da Itália é mais grave, já que boa parte de suas dívidas é de curto prazo, o que significa que precisa ir aos mercados mais regulamente que os espanhóis, irlandeses e gregos. A Itália não está falida, mas está sendo trazida para o vortex do risco cada vez maior enfrentado pelos políticos e pelo Banco Central Europeu. Alguns analistas consideram que o pacote de resgate de 1 trilhão de euros lançado há pouco tempo terá de ser elevado para 4 trilhões se os italianos não conseguirem se livrar de suas dívidas e buscarem um resgate. Esta conta será muito alta mesmo para os alemães. Não é por acaso que o primeiro-ministro finlandês Jyrki Katainen disse na semana passada que a Europa “está numa situação muito perigosa”.
Enfrentando os mercados em queda livre na semana passada, o chefe do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, disse à Espanha e à Itália que os dois paises precisavam de novos pacotes de austeridade. Os espanhóis vão divulgar o deles em 19 de agosto, enquanto os italianos dizem que vão tentar chegar a um “consenso nacional” até setembro.
“De cara, o BCE fez um convite explícito à Espanha e Itália para que façam mais. Isso provavelmente será feito. Se as coisas se tornarem espetacularmente ruins nas próximas semanas, o BCE não terá escolha a não ser expandir a compra de papéis dos governos”, disse Gilles Moec, um economista do Deutsche Bank. A dívida espanhola e italiana poderia ser comprada em massa pelo BCE, o que já está acontecendo com a dívida grega.
Mas o sr. Trichet revelou que não existe unanimidade no BCE sobre a necessidade de comprar dívida italiana e espanhola. Os corretores ficaram com as orelhas ardendo com as palavras do chefe da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, ditas em 21 de julho, quando ele se disse “profundamente preocupado” com as economias espanhola e italiana. Ele colocou parte da culpa no que chamou de “comunicação indisciplinada, complexidade e incompletude” do pacote de resgate da Grécia.
Em resumo, os mercados estão nervosos e esperando pelos pingos nos is do resgate grego. “Um mês atrás viamos o fim no horizonte, mas agora poderemos ter mais quatro ou cinco anos a percorrer. O que vimos é uma mudança psicológica. A diferença é que no primeiro aperto de crédito vimos um movimento coordenado em busca do resgate. Mas agora temos visto tentativas parciais de solução do problema”, disse David Bloom, chefe de estratégia do HSBC.
Ação lenta e disputas políticas no coração da eurozona parecem ser um grande problema para os mercados: “Com a crise da Lehmann, tinhamos Hank Paulson e alguns líderes-chave que podiam juntar as pessoas e rapidamente lidar com as coisas. Na Europa não se pode fazer o mesmo. Há fraqueza institucional”, disse Dan Morris, estrategista de mercado do JP Morgan.
Tudo isso acontece em meio a preocupações com os sistemas bancários da União Europeia e do Reino Unico; tendo enfrentado as dificuldades de crédito e tendo sido resgatados pelos contribuintes, os bancos agora enfrentam o risco de ver o que acreditavam ser seus investimentos dourados — dívidas de governos — valer muito menos que originalmente imaginavam. E é aqui que está o risco para o Reino Unido.
Os bancos britânicos controlam quantidades massivas de dívida da eurozona — na semana passada o RBS assumiu a perda de 733 milhões de libras [equivalentes a 1,9 bilhão de reais] em dívidas do governo grego, mas isso é pouco. Algumas estimativas colocam a exposição de bancos britânicos a dívidas de governos da eurozona em 200 bilhões de libras [equivalentes a 520 bilhões de reais]. Ainda assim, apesar deste risco, o Reino Unido ainda é visto como um paraíso, com o governo capaz de emprestar aos menores juros dos últimos 50 anos.
Mas existe outra tempestade em potencial para os investidores. Os números econômicos dos Estados Unidos não são bons e com isso vem o medo de uma recessão dupla. Mesmo os mercados emergentes não estão a salvo: “Temos vários contágios ao mesmo tempo em andamento na economia mundial e isso atinge as economias em desenvolvimento, porque os maiores mercados são os dos Estados Unidos e da Europa”, disse Phil Poole, chefe de estratégia de investimento global do HSBC.
Karl Marx, que sem dúvida teria exultado com o banho de sangue nos mercados, uma vez disse: “A História se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa”. A semana passada certamente parecia a repetição da História, com mais que um toque de farsa.
Additional reporting by Laura Chesters.
*Quando os jornais escrevem dinheiro “perdido” na bolsa, isso significa que os papéis se desvalorizaram.
0 falações!:
Postar um comentário