domingo
A folha insiste, mas, é Dilma 2010...
Quanto mais a Folha de S.Paulo tenta se safar da denúncia de manipulação intencional em sua edição sobre o ''sequestro de Delfim Netto'' pelo ''grupo de Dilma Rousseff'', mais transparente fica a sua vileza jornalística. A ''explicação'' publicada neste domingo (28) pelo jornal da dinastia Frias não convence nenhum brasileiro, mesmo leigo em jornalismo, que ponha os neurônios para funcionar.
Por Bernardo Joffily
. O episódio se arrasta desde o dia 5 de abril. O internauta que desejar recuperá-lo pode recorrer às matérias do Vermelho listadas ao pé deste texto.
O resumo da ópera
Em linhas muito gerais: 1) em 5 de abril a Folha estampou em sua capa, sobre um pouco usual fundo vermelho, a falsidade que ilustra esta matéria' ilustrada por uma ''ficha'' de Dilma no Dops na verdade montada por sites da extrema direita; 2) no mesmo dia o professor Antonio Roberto Espinosa, ''fonte'' involuntária da falsificação, escreveu ao jornal uma longa e indignada carta, publicada com cortes convenientes; 3) nos dias 7 e 12 o ombudsman Carlos Eduardo Lins da Silva cobrou do jornal a publicação da íntegra, ao menos na Folha Online, jamais realizada; 4) no dia 25 a Folha admite que ''a utenticidade de ficha de Dilma não é provada''... ''bem como não pode ser descartada''; 5) no dia 30 o jornalista Luis Nassif divulga em seu blog carta enviada ao jornal dos Frias, e jamais publicada, onde a ministra acusa a matéria de ''ter características de factóide'' e faz duas perguntas simples: ''Em que órgão público a Folha de S.Paulo obteve a ficha falsa? A quem interessa essa manipulação?''.
Este é apenas o resumo da ópera.
Nele sobressaem a má vontade, a má fé, a má qualidade da falsificação jornalística e sobretudo a soberba, presunçosa e preguiçosa recusa em voltar atrás no conteúdo da armação. Se o professor Emir Sader estiver certo quando decifra a FSP como sendo a Força Serra Presidente, o jornal está prestando um porco serviço ao seu candidato.
Melhor seria fazer como no episódio da ''ditabranda'', em 17 de fevereiro: enfiar o rabo entre as pernas e reconhecer o erro de conteúdo e princípios éticos jornalísticos. Para a Folha admitir que ''o uso da expressão 'ditabranda' foi um erro'' e ''todas as ditaduras são igualmente abomináveis'' foram necessárias três semanas, um número não revelado de iradas cartas de leitores e cancelamentos de assinaturas e até uma manifestação de rua diante da sede do jornal. Quantos leitores a Folha irá perder antes de recuar desta vez?
Cinco infâmias escolhidas
No entanto parece que a dinastia Frias tem um ritmo muito próprio para se dar conta de que foi flagrada numa situação jornalística e eticamente insustentável. O texto publicado hoje o atesta.
1. A chamada na capa é discreta, com apenas duas frases, na metade inferior da página, enquanto a outra, a vermelha, figurava bem em cima (veja as reproduções).
2. Os títulos da capa – Laudos pagos por Dilma dizem que ficha é fabricada – e da página interna – Dilma contrata laudos que negam autenticidade de ficha – destaca, inexplicavelmente, que os laudos foram ''pagos'' ou ''contratados'' (?) e apenas em segundo plano que acusam uma falsificação do jornal.
3. O texto, finalmente, responde a uma das perguntas de Dilma: a ficha não veio de nenhum órgão público, mas chegou ao jornal ''por e-mail''. Mas silencia pudicamente, ou desavergonhadamente, sobre quem enviou a mensagem.
4. Sem assinatura, apenas com a indicação ''da reportagem local'' (a quem Otavio Frias pensa que engana?), o texto supostamente distanciado e anódino repete que publicou ''uma ficha cuja autenticidade não podia ser assegurada, bem como não podia ser descartada''. Assevera que ''a Folha tem procurado checar a autenticidade da ficha'' e até contratou três eméritos peritos para isso, mas ''todos disseram que teriam dificuldades em emitir um laudo''. Não seria mais fácil, rápido e eficaz perguntar logo ao remetente do e-mail?
5. Salto aqui outros ardis – de pequena e média gravidade – para chegar logo à infâmia final. Domingo é, há mais de uma década, o dia da coluna do ombudsman. Hoje, Carlos Eduardo Lins da Silva fala do jornalismo cidadão no Irã e da morte de Michael Jackson. Deve ser dura a vida de ombudsman da Folha...
Será que o ombudsman não sabia? Difícil, pois o próprio texto diz que "a ministra anexou o laudo da Unicamp em carta ao ombudsman da Folha". E cita a mensagem de Dilma: ''Diante da prova técnica da falsidade do documento, solicito providências no sentido de que seja prestada informação clara e precisa acerca da 'ficha' fraudulenta, nas mesmas condições editoriais de publicação da matéria por meio da qual ela foi amplamente divulgada, em 5 de abril de 2009'' – solicitações que o jornal da dinastia Frias se esmera em não atender.
O internauta que lê estas linhas pode pensar o que melhor lhe parecer sobre Dilma a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma a ''mãe do PAC'' e Dilma a candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à sua sucessão dentro de 15 meses. Mas nenhum ser humano merece que se cometa contra ele tão repugnantes e continuadas indignidades jornalísticas.
Santa Joana D'Arc e santa Dilma
Dilma Rousseff, segundo uma correspondência da Embaixada dos Estados Unidos enviada ao Departamento de Estado quando ela assumiu como ministra, quando jovem presa política da ditadura ficou conhecida entre os companheiros domo ''a Joana D'Arc da esquerda''. Deve ser preciso mesmo uma paciência de santa para aturar a fogueira incineradora da Força Serra Presidente. Ainda mais quando os algozes misturam à sanha piromaníaca uma tão torpe lerdeza. Decerto nem se dão conta de que puseram fogo às próprias vestes.
Confira abaixo o texto integral do que foi publicado na Folha deste domingo:
Na capa:
''Laudos pagos por Dilma dizem que ficha é fabricada''
Dois laudos pagos pela ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) negam a autenticidade de ficha reproduzida pela Folha com ações armadas de grupos em que ela militou. Os opareceres são de professores da Unicamp e de perito da UnB.''
Nas páginas internas:
''Dilma contrata laudos que negam autenticidade de ficha''
''A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, encaminhou à Folha dois laudos técnicos, por ela custeados, que apontaram ''manipulações tipográficas'' e ''fabricação digital'' em uma ficha reproduzida pela Folha na edição do último dia 5 de abril.
A ficha contém dados e foto de Dilma e lista ações armadas feitas por organizações de esquerda nas quais a ministra militou nos anos 60. Dilma nega ter participado dessas ações. A imagem foi publicada pela Folha com a seguinte legenda: ''Ficha de Dilma após ser presa com crimes atribuídos a ela, mas que ela não cometeu''.
O laudo produzido pelos professores do Instituto de Computação da Unicamp (Universidade de Campinas) Siome Klein Goldenstein e Anderson Rocha concluiu: ''O objeto deste laudo foi digitalmente fabricado, assim como as demais imagens aqui consideradas. A foto foi recortada e colada de uma outra fonte, o texto foi posteriormente adicionado digitalmente e é improvável que qualquer objeto tenha sido escaneado no Arquivo Público de São Paulo antes das manipulações digitais''.
O laudo produzido pelo perito Antonio Nuno de Castro Santa Rosa da Finatec (Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos), ligada à UnB (Universidade de Brasília), chega às mesmas conclusões.
A ministra anexou o laudo da Unicamp em carta ao ombudsman da Folha. ''Diante da prova técnica da falsidade do documento, solicito providências no sentido de que seja prestada informação clara e precisa acerca da ''ficha'' fraudulenta, nas mesmas condições editoriais de publicação da matéria por meio da qual ela foi amplamente divulgada, em 5 de abril de 2009'', escreveu Dilma.
Em reportagem publicada no dia 25 de abril, intitulada Autenticidade de ficha de Dilma não é provada, a Folha reconheceu ter cometido dois erros na reportagem original. O primeiro foi afirmar, na Primeira Página, que a origem da ficha era ''o arquivo [do] Dops''. Na verdade, o jornal recebera a imagem por e-mail. O segundo foi tratar como verdadeira uma ficha cuja autenticidade não podia ser assegurada, bem como não podia ser descartada.
O jornal também publicou um Erramos com os mesmos esclarecimentos. A ministra se disse insatisfeita, questionou a nova reportagem e decidiu contratar um parecer técnico.
Para a análise, os professores descartaram a imagem da ficha reproduzida pela Folha em sua edição impressa. Captaram na internet cinco imagens ''com conteúdo similar ao utilizado pelo jornal Folha de S.Paulo''. Dentre elas, escolheram como ''objeto do laudo'' a imagem divulgada no blog do jornalista Luiz Carlos Azenha, que reproduz artigos que criticam o jornal e questionam a autenticidade da ficha.
Para os peritos, a imagem do blog era a que tinha ''a maior riqueza de detalhes''. Goldenstein disse à Folha que ''todas as imagens são de uma mesma família'' e que a qualidade da imagem publicada pelo jornal não é boa o suficiente para ''análise nenhuma''.
Os professores compararam a imagem com documentos reais que supostamente teriam alguma semelhança (papel, caracteres) com a ficha questionada. Trata-se de cópias de fichas de presos pela ditadura, hoje abrigadas no Arquivo Público paulista. Escolheram as produzidas entre 1967 e 1969.
Contudo, no Erramos e na reportagem publicados no final de abril, a Folha havia explicado que a origem da ficha não era o Arquivo Público. A imagem não é datada - relaciona eventos ocorridos entre 1967 e 1969, mas pode ter sido produzida em data posterior.
Para concluir que a fotografia foi ''recortada e colada'', os professores compararam a foto de Dilma com fotos que encontraram no mesmo arquivo. A ficha questionada não informa que a foto de Dilma foi obtida naquele arquivo.
Sobre a impressão digital contida na ficha, os peritos apontaram não ser possível nenhuma conclusão, devido à baixa qualidade da imagem.
Crimes negados
Ouvido pela Folha na última quinta-feira, Goldenstein disse que não leu o blog do jornalista em que captou a imagem analisada e tampouco a reportagem original da Folha. ''Não estou criticando o que a Folha fez. Vou ser bem sincero, eu nem li a reportagem original da Folha. Não cabe a mim julgar absolutamente nada. Meu papel é analisar essas imagens digitais que estão circulando na internet. O que a ministra me pediu: 'É possível verificar, é possível um laudo sobre a autenticidade/origem da imagem? É possível dizer se vieram ou não do Arquivo Público?'.''
Doutor em ciência da computação pela Universidade de Pennsylvania (EUA), ele diz que foi o primeiro laudo externo que produziu em sua carreira. A ficha questionada era uma das imagens que ilustrava a reportagem original cujo título foi: Grupo de Dilma planejou sequestro de Delfim Netto.
Na carta à Folha, Dilma escreveu: ''Reitero que jamais fui investigada, denunciada ou processada pelos atos mencionados nesse documento falso e de procedência inidônea, ao qual não se pode emprestar nenhuma credibilidade''.
A Folha tem procurado checar a autenticidade da ficha. Foram contatados três peritos de larga experiência na análise de documentos e um especialista em imagens digitais.
Todos disseram que teriam dificuldades em emitir um laudo, pois necessitavam do original da ficha, que nunca esteve em poder da reportagem. Disseram que a análise de uma imagem contida num e-mail não seria suficiente para identificar uma eventual fraude.''
Postado por
Michel Chaves
às
11:17
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